DAlila Teles Veras Poemas do livro ESTRANHAS FORMAS DE VIDA |
|
|
|
abismos
“Dizem as velhas da praia que não voltas. São loucas! São loucas!” Barco Negro, David Mourão-Ferreira / Caco Velho / Piratini
diante de seus medos um homem com toda a fragilidade de um homem
(na esquina do viver onde a luz encontra as trevas e prenuncia tormentas)
um homem que se recusa assistir ao embarque protagonizar a despedida
em desespero, agarrado ao cordão, em vias de
um homem e seus abismos incontornáveis |
|
qual o modelo?
“Não sei, não sabe ninguém” Foi Deus, Alberto Janes
- qual o modelo que tu queres de mim? - qual o modelo afinal? - qual o modelo? - qual o modelo? - qual o modelo?
grita a jovem, olhar no vazio no topo das escadarias do metrô
qual o modelo?... qual o modelo?... qual o modelo?... a pergunta/mantra ecoaaaaaaaaaaaaa subterrâneos adentro embarca ao lado dos passageiros mudos (carga extraordinária ao final do dia) |
|
miserere (corpo em dor)
"Não queiras penas alheias, Que as tuas chegam-te bem" Filosofias, João Linhares Barbosa / Francisco Viana
seta açodada, pungitiva adaga (dor, dor, dor, dor) corpo em frangalhos avinagrados alhos dolor, ache, douleur dor sem filiação lingüística dor (in)verbalizável
duradoura dor, dura dor, nervura fervente dor sem trégua, dor humilhante e impertinente dor, invisível ao outro íntima dor (vergonhosa experiência misantrópica)
nocauteado vai à lona o corpo paroxismo ao oitavo dia
|
|
homem-tração
“Assim devera eu ser de patinhas no chão, formiguinha ao trabalho e ao tostão.” Formiga Bossa Nova, Alexandre O´Neill / Alain Oulman
recolhem latas, caixas, vidros, papéis (miserável quinhão no latifúndio consumista)
brancaleônicas figuras recolhem e carregam (penas - carga brutal) carregam e caminham caminham e descarregam (elas próprias, descartes
menos-valia não armazenável ração restrita à hora incerta e presente)
|
|